domingo, 25 de abril de 2010

Obrigado por fumar: Convencimento e Persuasão


O filme Obrigado Por Fumar (Thank You For Smoking) conta a história de Nick Naylor, um porta-voz de uma fábrica norte-americana de cigarros. Ele viaja pelos Estados Unidos realizando palestras, nas quais ameniza os males causados pelo tabagismo. O seu dilema principal é explicar para o seu filho em que consiste o seu trabalho e dar-lhe a devida educação.

Nick Naylor chega a dizer ao filho que é consciente dos malefícios do fumo, mas que com uma boa argumentação, é capaz de convencer às pessoas de que o cigarro não é tão prejudicial assim.

No livro Tratado da Argumentação, os autores Chaïm Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca ressaltam a dificuldade de um orador em se adaptar aos diferentes ouvintes. E que um bom orador, na verdade, deve adaptar-se às particularidades dos mais variados públicos. Eles também afirmam que as capacidades de convencimento e de persuasão do orador são importantes quando lidamos com o público. Assim como Rousseau, os autores acreditam que convencer e persuadir são coisas distintas. Para Rousseau, “de nada adianta convencer uma criança, se não se sabe persuadi-la”.

A diferença básica entre convencer e persuadir está relacionada com a razão e a emoção. Quando convencemos uma pessoa, estamos querendo entram em comum acordo partindo do princípio da racionalidade, no qual ambas as partes sairão ganhando. Já a persuasão é feita através do apelo aos sentimentos, à emoção. Para Blaise Pascal, tudo o que não é movido pela razão, é persuasão. O filme nos faz pensar o tempo inteiro a respeito dos discursos, em especial os publicitários, que nos chegam, seja através do convencimento ou da persuasão.

No entanto, no texto Tratado da Argumentação, os autores afirmam que uma convicção pode colidir contra outra convicção, já que esbarram nas diferenças dentro de um contexto. Fazendo um paralelo com o filme, uma das frases ditas pelo protagonista é: “O mais importante não é convencer o outro de que eu estou certo, mas sim que meu adversário está errado.”

Segundo o personagem Nick Naylor, se nós argumentarmos bem, nunca estaremos errados. Este pensamento nos remete a seguinte afirmação de Voltaire: "Posso não concordar com nenhuma palavra que dizes, mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-lo".


Livro:
Tratado da Argumentação. A nova retórica. 1969
De Chaïm Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca


Filme:
Thank You For Smoking, 2005
Dir. Jason Reitman

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Laranja Mecânica: Patologia Social e Behaviorismo


O filme Laranja Mecânica (A Clockwork Orange) se passa numa sociedade futurística e metafórica na qual percebemos haver várias desordens sociais. Segundo Émile Durkheim, a desordem social deve ser tratada como uma patologia para que não afete a sociedade como um todo. No filme, percebemos instituições como a Família, o Sistema Penitenciário, o Governo e a Polícia como possuidores de inúmeros conflitos que prejudicam o bom funcionamento holístico da sociedade.

O filme conta a história de Alex de Large, um jovem que não estuda, não trabalha e que, juntamente com a sua gang de criminosos, pratica assaltos, estupros e assassinatos. Durkheim parte do princípio de que o homem deixa de ser um simples animal selvagem quando aprende hábitos e costumes característicos de seu grupo social para poder conviver em sociedade.

Alex não aprende a viver de acordo com as normas sociais por ser fruto de uma sociedade doente. Juntamente com o seu bando, Alex pratica uma série de crimes e certa vez é preso e condenado a 14 anos de prisão.

O Estado, numa tentativa de mostrar-se ainda eficaz, lança o método Ludovico que consiste na recuperação de presos para que retornem ao convívio social. A técnica baseia no behaviorismo, um campo da psicologia que afirma, segundo John B. Watson, que o comportamento é condicionado através do estímulo/ resposta, principalmente quando o indivíduo sofre alterações no sintema glandular e locomotor.

Em Laranja Mecânica, Alex é submetido a sessões de tortura que, graças a uma substância que lhe é injetada, o fazem vomitar quando este assiste a cenas de sexo e de violência extrema. As sessões de tortura são repetidas inúmeras vezes até que o organismo de Alex não mais necessite da substância e reaja com náuseas automaticamente quando assiste às cenas.

Tal experimento assemelha-se ao realizado por Ivan Petrovich Pavlov com um cãozinho. Quando avistava a comida, o cachorrinho respondia salivando. Pavlov passou a tocar uma sineta toda vez que alimentava o animal. Depois de determinado tempo, o animal salivava apenas ao ouvir a sineta.

No filme, o Estado faz uma demonstração pública afim de informar à sociedade a eficácia do método utilizado para restabelecer o convío social dos criminosos. Alex ganha, então, a liberdade. Ele retorna para a mesma sociedade patologicamente deficiente de antes.

Émile Durkheim e John B. Watson defendiam a ideia de que o homem era um animal selvagem que aprendia a viver socialmente ao observar o funcionamento das instituições e o comportamento alheio. No entanto, ambos estudiosos afirmavam que todo indivíduo possuía desejos próprios que o distinguiam dos demais indivíduos. E, portanto, Alex, no final do filme, não nos surpreende ao nos reafirmar os seus desejos primitivos.

Por Jurdiney da Costa Pereira Junior


Livros:
BURGESS, Anthony. A Clockwork Orange. 1962
DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. 1895


Filme:
A Clockwork Orange. 1971.
dir. Stanley Kubrick.

sábado, 3 de abril de 2010

A Vila e o Mito da Caverna


O filme A Vila (The Village) possui algumas características semelhantes ao Mito da Caverna, ou a alegoria da caverna, narrado por Platão no capítulo 7 do livro A República.

O mito da caverna consiste na apresentação hipotética de homens amarrados às correntes no interior de uma caverna desde o nascimento. Esses homens não conseguem enxergar outra coisa além de sombras projetadas nas paredes da caverna advindas da parte externa, juntamente com os sons que ocorrem do lado de fora. Não conseguindo nem sequer observar os companheiros de clausura, esses homens julgam as sombras de homens e pássaros projetadas na parede como sendo a própria realidade das coisas.

Certa vez, um dos homens consegue se libertar das correntes e sair da caverna. Depois de deparar-se com a realidade, o homem retorna ao interior da caverna e tenta descrever para os seus companheiros a verdadeira realidade que encontrara. Ele tem certa dificuldade em narrar aos seus companheiros de clausura porque estes não possuem referência alguma do que está sendo dito.

Esta estória nos apresenta, metaforicamente, a saída da ignorância para a conquista do pensamento racional. Para Platão, há dois mundos: o Mundo das Ideias e o Mundo das Sombras, ou Mundo dos Sentidos. Segundo ele, para atingirmos a racionalidade, devemos nos abster, paulatinamente, dos nossos sentidos, pois estes nos fazem enxergar o mundo de uma forma errônea.

O filme A Vila (The Village) conta a história de um grupo de pessoas cansado do estresse e das conturbações da vida moderna cotidiana que recria uma vila típica de 1897 isolada do restante da civilização contemporânea. Estas pessoas, conhecidas como sábias ou anciãs, transmitem aos mais jovens a ideia de que há monstros perigosos para além da floresta, a fim de manter a farsa velada.

Ora, esses habitantes da vila, enganados pelos mais velhos, são como os homens acorrentados como descritos por Platão. E, assim como Platão acredita que os sentidos nos afastam do pensamento racional, no filme, os anciãos reforçam a ignorância dos mais jovens quando despertam os seus sentidos através do medo. Como por exemplo, a aversão à cor vermelha e o aparecimento dos animais abatidos.

Ironicamente, a única personagem que consegue descobrir o segredo da fictícia vila é uma deficiente visual, Ivy Walker, mostrando-nos que os sentidos não são necessários para a conquista da racionalidade. Algo não muito diferente do que propunha Platão há milhares de anos atrás.

Por: Jurdiney Pereira Junior

Livro:
A República, Platão - séc. IV a.C.

Filme:
The Village, dir. M. Night Shyamalan. - 2004

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Sobre o Blog Filosofilmes

O Blog Filosofilmes foi elaborado com o intuito de, assim como seu próprio nome sugere, relacionar os mais diferentes filmes ao universo da Filosofia.

Porém, não iremos analisar os filmes em sua totalidade. Também não serão discutidos os filósofos e seus pensamentos como um todo. O que está sendo proposto pelo Blog Filosofilmes é a apresentação de links sutis entre a filosofia e a sétima arte.

As análises apresentadas não tratam de explicar, resumir ou criticar os filmes, mas sim analisar temas isolados relacionando aos filósofos. Como por exemplo, a amizade retratada em Star Wars e o que Aristóteles nos diz sobre a questão da amizade.

Além dos filósofos tradicionais, serão apresentados também autores de teorias modernas de áreas como sociologia e comunicação. O Blog Filosofilmes não possui a pretensão de utilizar o pensamento filosófico de forma aprofundada e acadêmica. Mas sim, de forma leve e descontraída.

Considero importantíssima a participação dos visitantes e seguidores do Blog Filosofilmes. Todos os comentários, críticas e sugestões serão sempre bem-vindos.

A intenção do Blog Filosofilmes é, antes de mais nada, incentivar o pensamento crítico e analítico a respeito dos mais diversos filmes. Acreditamos que a combinação entre a Sétima Arte com a Filosofia seja grandiosamente enriquecedora para a alma. Sintam-se todos à vontade e a sessão vai começar.

Atenciosamente,
Jurdiney C. Pereira Junior