sábado, 15 de maio de 2010

Chaplin, Marx e Foucault


O Filme Tempos Modernos (Modern Times) retrata o personagem Carlitos totalmente perdido numa sociedade que apresenta sinais da modernidade. Ele começa o filme trabalhando numa fábrica na qual o presidente os observa atentamente de sua sala através de câmeras.

O trabalho de Carlitos consiste na simples tarefa de apertar parafusos. De acordo com Karl Marx, as condições materiais determinam as formas de pensamento. Ou seja, para ele, Carlitos estaria alienado por não conhecer todo o processo de produção em série e apenas o trabalho de apertar parafusos ao qual fora submetido. Podemos perceber que, até mesmo depois de sair da fábrica, Carlitos continua a apertar parafusos de hidrantes e botões dos vestidos das mulheres que caminham pela rua. Servindo a assim para reforçar ideia de que o trabalho de produção em série torna o sujeito alienado.

Carlitos é tido como louco e é encaminhado a um hospital psiquiátrico. Esta transição da fábrica para o hospício nos remete a transição dos indivíduos dentro das instituições como bem descreve Michel Foucault em seu conceito de sociedade disciplinar.

Segundo Foucault, o poder disciplinar consistia na transição dos cidadãos dentre as mais variadas instituições como a Família, a Escola, o Hospital, a Fábrica e instituição suprema de poder disciplinar, o Presídio.

Esta sociedade disciplinar que, seguindo Foucault, perdurou até meados do século XX, disciplinava seus cidadãos fazendo-os transitar pelas mais diferentes instituições a fim de torná-los corpos dóceis. Ou seja, torná-los moldáveis de acordo com o interesse do Estado.

Porém, depois que deixa o hospício e encontra a fábrica fechada, Carlitos caminha pela rua e encontra uma bandeira que acabara de cair de um caminhão. A bandeira (supostamente vermelha, já que o filme é em preto e branco) reforça a ideia de manifestação comunista. Já que, logo em seguida, juntam-se a Carlitos inúmeros trabalhadores em tom de protesto.

Marx, afirma no Manifesto do Parido Comunista que a revolução é a força motriz para o desenvolvimento histórico da humanidade. E isto só é possível através de luta entre classes. Neste caso, sendo a burguesia, os opressores e o proletariado, os oprimidos. Carlitos, então, é preso como líder comunista e adentra a instituição disciplinar suprema descrita por Foucault, o Presídio.

Depois que cumpre a sua pena e ganha, mais uma vez, a liberdade, Carlitos encontra dificuldades para se estabelecer em algum emprego. Distante do modelo consumista, Carlitos já não sabe mais que rumo tomar e faz de tudo para retornar à prisão. Ele também conhece uma jovem com a qual irá sonhar ter uma casa e constituir uma família. No entanto, como ambos desconhecem os meios de produção da sociedade na qual estão inseridos, eles sonham que a casa ideal terá frutas a serem colhidas pela janela e vaca dando leite à sua porta.

O filme é uma ótima ilustração para questões descritas por Marx e conceitos de Foucault. E que consegue, graças ao brilhantismo do roteiro, atuação e direção de Charles Chaplin, fazer com que questões tão delicadas e pertinentes em nossa sociedade sejam retratadas de forma leve e sutil, mesmo num filme de humor.

Por Jurdiney da Costa Pereira Junior

Livros:

FOUCAULT, Michel. O poder psiquiátrico. 1973-1974

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 1975

MARX, Karl. Manifesto do Partido Comunista. 1848

Filme:

Modern Times. 1936
Dir. Charles Chaplin

8 comentários:

  1. Parabéns pelo texto, muito bem escrito.
    abraços
    Heitor

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  2. Tempos Modernos (Modern Times) é um filme incrível, no qual, Chaplin encarna pela última vez o saudoso Carlitos, personagem que lhe trouxe fama e prestígio. Em 1936, ano de lançamento da película, os tempos haviam mudado desde que Carlitos fora concebido, em meados de 1910, pois a "modernidade" tinha transformado a sociedade em todos os aspectos(socio, politico e econômico) e Chaplin com uma maestria inefável, através de sua pantomima, trata de demonstrar tal realidade. Temas como o American way of life, Fordismo e a Grande Crise de 1929 são abordados de forma cômica e com ocasionais trechos de emoção, característicos dos filmes de Chaplin.

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  3. Não é a toa que eu estou seguindo este blog. As reflexões são de muito bom tom e super importantes para se pensar sobre o mundo, sobre as pessoas, e sobre nós mesmo.
    Muito boa a escolha. Diante das reflexões incitadas pelo autor do post, eu só gostaria de acrescentar a questão da desidentificação que a privação de liberdade condena ao homem. Além de Tempos modernos, também tratados pelos filmes " só resta a esperança" e " um sonho de liberdade" que se não nao foram motivos de post, é uma excelente recomendação.
    A comunidade blogueira carece de blogs que não ocupem apenas nossos tempos, mas também o nosso cerebro e esse é um excelente exemplo disso.
    Parabéns!

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  4. Gostei bastante do seu blog e vou seguir. Tenho estudado bastante Foucault e utilizei-o para estudar os corpos, em minha monografia. As disciplinas das mais diversas instituições buscavam fixar os indivíduos ao aparelho de produção. O diretor, ao examinar seus empregados, usurpa seu saber criando a partir disso uma norma para otimizar o sistema. Bem... fico por aqui.
    Grande abraço!

    www.costabbade.blogspot.com

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  5. Olá,
    eu passei aki pra dizer que vcs ganharam um selinho do meu blog.. Passem lá pra pegar ok?
    =*

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  6. Excelente construção textual. Seu discernimento das idéias desses caras é formidável. E vc parece ser jovem. As vezes atrelo o desenvolvimento das palavras com o mesmo das idéias e dos significados.
    Mas, como podemos definir claramente essa alienação? e se a condução do homem estiver implícita também a possibilidade de girar sempre os parafusos e isso possuir tamanho significado que não seja desejável outra coisa. Mas e esse desejo? como pode ser manifestado? de onde ele vem?
    Percebe como uma coisa puxa a outra e sempre teremos a partir de uma gde e boa idéia que considerar tantas outras possibilidades..ai,ai...
    bjs

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  7. Olá, como vai?
    Achei seu blog na comunidade Sócrates, platão, aristóteles... É uma ótima idéia o seu blog.
    Vou te dar algumas sugestões que considero bem bacanas: Waking Life; The Wall; Trainspotting; Donnie Darko.

    Grande abraço e sucesso.

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  8. Nunca tinha analisado o filme por esta perspectiva, estou cursando administração, o que me levava a analisar apenas o lado do trabalho repetitivo.

    Parabéns pelo texto!

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